segunda-feira, 17 de maio de 2010

Do objecto do processo

O objecto do processo é um elemento essencial do mesmo e, nas palavras do Sr. Professor, deve “assegurar a ligação entre a relação jurídica material e a relação jurídica processual, determinando quais os aspectos da relação jurídica substantiva, existentes entre as partes, que foram trazidas a juízo”.

Segundo a orientação tradicional, o objecto do processo deveria ser perspectivado de forma dualística conforme se tratasse de contencioso de anulação, em que o seu objecto seria o acto administrativo; ou contencioso das acções, cujo objecto seria constituído pelos direitos subjectivos alegados, semelhantemente ao processo civil.

A reforma do Contencioso Administrativo acabou por afastar este entendimento e a sua dicotomia que separava o contencioso de anulação do contencioso de plena jurisdição, proclamando um novo modelo constitucional de Contencioso Administrativo totalmente jurisdicionalizado e subjectivado, cumprindo a letra do art. 212º, nº3, bem como o art.268º, nº4, da CRP. Com efeito, este último artigo (e o art.2º/2 do CPTA) ao determinar que “a todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela adequada junto dos tribunais administrativos” eleva os direitos dos particulares a um outro nível, afastando, assim, definitivamente, a doutrina do “processo ao acto”, consagrando um contencioso de plena jurisdição.

Pedido

Conforme a posição tradicional, só importava atender à vertente imediata do pedido devido ao entendimento de que o particular não dispunha de qualquer situação jurídica subjectiva relativamente à Administração, estando aquele no processo apenas para defender a legalidade e o interesse público cuja lesão coincidia com um seu interesse de facto.

Este entendimento contende com o actual modelo constitucional de Justiça Administrativa, concretizado pela reforma do Contencioso Administrativo, que consagra o particular como titular de direitos nas relações jurídicas administrativas (art. 212º, nº3, da CRP) e estabelece um principio de protecção plena e efectiva dos seus direitos.

Assim, há que considerar o pedido na sua vertente imediata mas também na vertente mediata, ou seja, tanto no que respeita aos efeitos pretendidos pelas partes mas também atender às posições jurídicas subjectivas que tais efeitos visam proteger. Desta forma, todos os direitos das relações administrativas são susceptíveis de protecção jurídica e, para que sejam tutelados, podem ser formulados todos os pedidos, de acordo com as formas de processo adequadas.

Porém, quando esteja em causa uma acção pública ou popular, os sujeitos não têm já que deter um interesse pessoal na demanda pois actuam para defesa da legalidade e do interesse público (art.9º, nº2, CPTA), o que significa que, nestes casos e só nestes, se atenderá somente à vertente imediata do pedido pois o Contencioso Administrativo, nesta situação específica, desempenha directamente uma função objectiva. Mas claro, em moldes diferentes do defendido pela doutrina clássica do “processo ao acto” que seria para todas as situações.


Causa de pedir (sem problematizar a questão dos poderes do juiz por ter sido já abordado por um colega, para lá remeto essa importante matéria)

Para a doutrina tradicional do “processo ao acto”, a causa de pedir deveria ser a apreciação integral da actuação administrativa, de forma a permitir uma ponderação objectiva da legalidade ou ilegalidade do acto e quais as fontes da sua eventual invalidade.

Há que tomar uma orientação, relativamente à causa de pedir, conforme a função e natureza do Contencioso Administrativo.
Assim, segundo uma orientação objectivista (proclamada pela doutrina clássica mas também por uma moderna corrente italiana) deve-se ter, como causa de pedir, a consideração da validade ou invalidade do acto administrativo “independentemente das alegações dos particulares relativas aos seus interesses materiais lesados”.
Já uma orientação subjectivista entende que a causa de pedir deve ter uma ligação, uma relação, com os direitos dos particulares. Não deve ser a ilegalidade absoluta do acto mas sim a sua “ilegalidade relativa” por haver uma ligação entre a actuação administrativa ilegal e o direito subjectivo lesado, do particular.

A reforma do contencioso administrativo institui um modelo subjectivista visando a protecção plena e efectiva dos direitos dos particulares, pelo que, a causa de pedir deve ser entendida, não de forma absoluta ou abstracta, mas sim relacionada com as pretensões dos particulares, que decorre do entendimento do art. 95º, nº1, 1ªa parte, CPTA, que configura um principio geral do contraditório.
O contencioso administrativo consagra ainda, complementarmente, um mero expediente formal para a tutela directa da legalidade e do interesse público em sede de acção pública e de acção popular, mas aqui já não estão em causa interesses próprios e directos, o que justifica esta abertura à orientação objectivista.

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