sexta-feira, 23 de abril de 2010

Recurso hierárquico necessário

Recurso hierárquico necessário
Entende-se por recurso hierárquico necessário a faculdade que o particular tem de impugnar um acto praticado por um subalterno junto do seu superior hierárquico. Segundo Marcelo Caetano o recurso hierárquico necessário consistiria em solicitar ao superior hierárquico ou a órgão que exercesse superintendência sobre o autor do acto impugnado a substituição ou revogação daquele. Destas noções depreende-se que o conceito de hierarquia está inerente ao recurso hierárquico necessário. O Professor Freitas do Amaral adianta três sentidos da noção de hierarquia:
• Objectivo - que diz respeito a um modelo de organização administrativa
• Subjectivo - hierarquia stricto sensu – como o conjunto de órgãos administrativos ordenados de determinada forma
• Relacional – correspondente a um vínculo de subordinação
Junto da figura do recurso hierárquico necessário iremos encontrar a de recurso hierárquico facultativo. Será facultativo o recurso sempre que incidir sobre um acto administrativo susceptível de impugnação jurisdicional. O recurso hierárquico é necessário ou facultativo para que os particulares possam reagir jurisdicionalmente contra uma determinada conduta administrativa. Independentemente de se tratar de recurso hierárquico necessário ou facultativo podemos identificar aspectos que são comuns a ambos, a título exemplificativo: relativamente aos pressupostos processuais, a competência do órgão ad quem, a legitimidade do recorrente, a recorribilidade do acto e a tempestividade do recurso. Quanto aos fundamentos, ambos podem ter como fundamento a ilegalidade ou a inconveniência do acto. Por sua vez, é possível identificar aspectos distintos nos seus regimes. Em relação ao recurso hierárquico necessário, o prazo de interposição é de 30 dias, enquanto que para o facultativo o recurso deve ser interposto no prazo para utilização dos meios de reacção contenciosa contra a acção recorrida. No concernente aos efeitos sobre o acto recorrido a interposição do recurso hierárquico necessário implica a suspensão, a interposição do facultativo não tem eficácia suspensiva.

Evolução constitucional do recurso hierárquico necessário Até à 2ª RC, em 1989, conferia-se aos particulares o direito de recurso contencioso contra actos administrativos definitivos e executórios; posteriormente a 1989 o artigo 268º da CRP deixou de fazer referência à necessidade de o recurso ser interposto contra actos administrativos definitivos e executórios para poderem ser interpostos recursos a quaisquer actos que sejam lesivos de direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares. Ora, abandonado o critério da definitividade e adoptado o da lesividade do acto várias vozes se insurgiram quanto à constitucionalidade deste instituto e desta norma. Para um sector da doutrina, o legislador ordinário continuaria a estar livre de exigir a definitividade do acto, mediante legislação avulsa, entendendo, por isso, que a dualidade (recurso necessário/facultativo) continuaria a fazer sentido. Esta Doutrina é sustentada pelo Professor Freitas do Amaral bem como pelo Professor Vieira de Andrade. Para este sector doutrinário a exigência de impugnação administrativa era meramente ordenadora e não constituía um ataque aos direitos, liberdades e garantias dos particulares, nomeadamente o acesso ao tribunal. Para além disso, adianta que o número 4 do artigo 268º não impõe a abertura de um recurso contencioso imediato, apenas determina que a garantia contenciosa não se pode recusar quando existe um acto administrativo. No lado oposto situa-se a doutrina que entende que a alteração legislativa veio tornar o recurso hierárquico necessário inconstitucional, entre esta Doutrina encontra-se o Professor Vasco Pereira da Silva. Este autor considera que as previsões anteriores à RC de 89 caducaram por inconstitucionalidade superveniente e originariamente as criadas posteriormente. Considero que não se possa falar, no caso, de inconstitucionalidade, pois a figura em análise não afecta o direito ao acesso aos tribunais, apenas constitui um condicionamento que, aliás, é imposto pelo princípio da proporcionalidade. Deste modo o particular não deixa de ser protegido nem vê afectado o seu direito fundamental.
Passo agora a citar alguns dos argumentos que o Professor Vasco Pereira da Silva apresenta para justificar a sua opinião face à inconstitucionalidade do recurso hierárquico necessário:
• Violação do artigo 268º/4 da CRP, por negação do direito fundamental de recurso contencioso;
• Violação do princípio da desconcentração administrativa que implica a impugnabilidade dos actos dos subalternos, sempre que estes sejam lesivos;
• Violação do princípio da efectividade da tutela precisamente pelo efeito preclusivo da impugnabilidade da decisão administrativa no caso de não ter havido interposição de recurso hierárquico, no prazo de 30 dias
Para o Professor o legislador prevê a regra do recurso hierárquico facultativo, posição esta que é aceite tanto pela letra da lei como pela Jurisprudência dominante. A RC de 89 ao substituir o critério da definitividade pelo da lesividade retirou o suporte para que se pudesse afirmar a regra do recurso hierárquico necessário. Em suma, a letra da lei é clara, não obstante existir a possibilidade de leis avulsas virem impor a indispensabilidade de um recurso hierárquico necessário

Sem comentários:

Enviar um comentário