terça-feira, 13 de abril de 2010

Processo ao Acto e Processo de Partes

Actualmente os processos do contencioso administrativo são de partes e, assim, foi ultrapassada a doutrina clássica do "Processo ao Acto".

A doutrina do Processo ao Acto surgiu no modelo francês, no qual o contencioso administrativo era de tipo objectivo, ou seja, tinha como finalidade a mera verificação da legalidade de uma actuação administrativa. O Conselho de Estado, apesar de estabelecer o direito objectivo que se impõe à administração, não reconhece o direito subjectivo das partes.

O processo "girava" à volta do acto administrativo, que, como o Professor Vasco Pereira da Silva refere, era "tudo e todas as partes". O particular e a administração não eram consideradas partes: era entendido que estas apenas estavam em juízo para colaborarem com o tribunal na defesa da legalidade e do interesse público. Portanto, estes não podiam agir para defenderem direitos ou interesses próprios pois, ou se entendia que entre eles não podia existir uma relação jurídica ( defendido por Kelsen), ou, quando admitida tal situação, era concebida como uma mera "relação de poder" ( defendido por Mayer e Marcello Caetano).

Por o particular não ser considerado um sujeito, mas um mero "objecto do poder soberano" ou um "administrado", não lhe eram reconhecidos direitos subjectivos perante a administração e, assim, não era uma parte em sentido material.

A concepção Actocêntrica falhava também por basear-se em fundamentos contraditórios: a ideia de que o particular não estava em juízo para defender os seus próprios direitos, lesados por uma actuação administrativa ilegal, mas sim motivado por um impulso atruísta de defesa da legalidade e do interesse público não faz qualquer sentido prático.
Mesmo após a vigência dos artigos 20º/1 e 268º/4 e 5 da CRP - que previam o tratamento do particular como sujeito nas relações administrativas e a sua consideração como parte -, e da reforma de 1984/85 - que desenvolveu a transição do contecioso administrativo para o processo de partes -, eram frequentes as disposições que ainda reduziam a igualdade entre as partes e a possibilidade de intervenção destas no processo.

A doutrina clássica também negava o estatuto de parte à administração: de acordo com a lógica objectivista, a administração estava em juízo como "autoridade recorrida" para auxiliar o estabelecimento da legalidade e do interesse público exercido pelo tribunal. Esta negação do estatuto de parte à administração decorria da promiscuidade entre a administração e Justiça, uma vez que no processo de partes o juiz desempenha o papel de um terceiro, em face de dois interesses antagónicos que lhe são trazidos. Mesmo após a CRP de 1976 ter integrado o contencioso administrativo no Poder Judicial e a reforma de 1984/85 ter considerado as entidades públicas e particulares como partes, o art. 26º LEPTA continuava a referir-se à administração como "autoridade recorrida".

Num contencioso administrativo plenamente jurisdicionalizado e de natureza subjectiva, o particular e a administração são partes que, em juízo, defendem as suas posições: no caso dos particulares, a afirmação da lesão de um direito, no caso da administração, a defesa da legalidade e do interesse público. Portanto, a administração é chamada a juízo para explicar os as razões da sua actuação concreta, e a sua situação processual é idêntica à do particular.

Por fim, hoje em dia a doutrina clássica do Processo ao Acto foi afastada, uma vez que o Código prevê no seu art. 6º a regra de que os particulares e a administração são partes no processo administrativo e consagra o Princípio da Igualdade Efectiva da sua participação processual.
Marisa Ribeiro dos Santos A6 16781

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